Como gerir a ansiedade das crianças durante e depois da pandemia?

Os estudos mais recentes concluem que a prevalência dos sintomas de ansiedade e de depressão aumentou com a pandemia, sobretudo nas crianças que tiveram menos apoio dos pais.

No caso de Rodrigo a família nunca lhe faltou, no entanto, depois de muitos meses de isolamento profilático, sem aulas presenciais e longe dos colegas, este aluno de 11 anos, presença habitual em tempos passados no quadro de honra da escola, é agora uma criança diferente. Atualmente revela-se menos confiante, mais ansioso e tem uma autoestima mais baixa. 

Essas alterações de comportamento têm sido particularmente visíveis nestes primeiros meses de aulas, ainda marcados pela incerteza e pelo receio de um eventual contágio. As escolas mantêm atualmente as mesmas dinâmicas relacionais e de aprendizagem do último ano letivo, até que o vírus SARS CoV-2 seja oficialmente declarado como erradicado pela Organização Mundial de Saúde, situação que, de acordo com os especialistas, deverá apenas verificar-se no próximo ano letivo. Assim, as palavras de ordem devem continuar a ser prevenção e segurança sanitária.

Mas as preocupações com a saúde mental dos mais novos deve, sem dúvida, ser um imperativo.

 

Rodrigo tenta não pensar nos riscos que enfrenta ao ir para a escola, prefere concentrar-se nos testes que tem pela frente - o próximo é o de matemática - mas, por mais que queira, não consegue abstrair-se. Apesar de ter sido sempre um aluno de excelência, agora, e ao contrário do que acontecia antes, acusa falta de confiança, sobretudo antes de uma prova escrita ou oral. A mãe, Sofia, afirma: "O meu filho anda nervoso, ansioso, duvida das suas capacidades. Não tenho dúvidas que o meu filho ainda não se libertou dos efeitos negativos desta pandemia. Ele não era assim!".   

É fundamental que essa ansiedade e falta de confiança sejam identificadas e tidas em conta logo durante a fase inicial em que se manifestam, antes que ganhem maiores dimensões e se tornem mais difíceis de gerir. Uma criança com falta de confiança terá mais probabilidade de ter dificuldade em experimentar novas realidades mais desafiantes, por medo de falhar e de desiludir terceiros. Carl Pickhardt, psicólogo e autor de vários livros de educação parental, confirma esta situação, defendendo que "os inimigos da confiança são o desencorajamento e o medo". 

Em casa, os pais de Rodrigo estão atentos a todos os sinais e procuram desenvolver simples estratégias que permitam ao filho sentir-se melhor, e mais confiante, nomeadamente antes das suas avaliações, sendo admitido pela mãe: "costumo colocar uma música divertida no carro durante o caminho até à escola". 

No mesmo sentido, um simples sorriso dos pais ou uma brincadeira, por vezes, são suficientes para ajudar a criança a descontrair e, em simultâneo, aumentar a confiança antes de um momento de avaliação. Na fase que atravessa, Rodrigo precisa desse estímulo extra para vencer o stress que o tem atormentado, sobretudo antes dos testes, e que tanto lhe perturba o próprio funcionamento: "por vezes, reparo que tem as mãos suadas, o coração acelerado e noites de insónias", acrescenta a sua mãe. 

O caso de Rodrigo é comum a várias crianças, privadas durante vários meses de socializar com outras pessoas do meio extrafamiliar. Este impedimento é normal que tenha contribuído para uma maior dificuldade de adaptação ao contexto escolar. O fantasma da Covid-19 ainda está muito presente, mas não deve transformar-se numa obsessão! Por exemplo, enquanto está nas aulas, o Rodrigo habituou-se a retirar a máscara apenas durante as refeições: "os meus pais disseram-me para tentar não me aproximar muito de outras pessoas, sobretudo se estivessem sem máscara".  Diz ainda ter saudades dos tempos em que podia brincar livremente e sem qualquer receio com os seus amigos mais próximos: "antes era tudo muito mais divertido, até podia ir para casa dos meus colegas, agora a minha mãe não quer". Na escola de Rodrigo, as aulas começam às 8 da manhã. Quando entra na sala, já nem ousa retirar o casaco: "a professora deixa sempre a janela e a porta abertas e costuma fazer frio"

Depois de alguns meses de aprendizagem por computador, considera, ainda assim, que, mesmo com estas restrições, é bom estar de volta. "A vacinação completa oferece, sem dúvida, maior tranquilidade, apesar de poder não ser suficiente para travar um eventual contágio. Mas a vida tem de continuar e nós não podemos ser eternos reféns desta maldita pandemia, muito menos as crianças. A pandemia não acabou, o vírus não morreu, mas o desejo de recuperarmos a nossa vida é maior do que o medo", sublinha Sofia.

Os pais de Rodrigo, tal como acima foi dito, procuram sempre transmitir-lhe segurança e confiança. As crianças não raras vezes refletem o estado emocional dos seus cuidadores. É essencial que tenham em casa bons exemplos de serenidade, sobretudo nos momentos de crise. Ajudá-las-à a sentirem-se mais tranquilas, como se pretende, e com maior capacidade para resolver os seus próprios desafios.  

No final de um dia de aulas, os pais de Rodrigo costumam perguntar ao seu filho como lhe correu o dia, através de uma pergunta aberta cuja intenção é apenas dar "espaço" para qualquer tipo de resposta ou de manifestação de sentimentos. É essencial nunca esquecer de valorizar cada esforço da criança para ultrapassar as próprias dificuldades.  É igualmente importante manter em aberto a via de diálogo com os professores. 

Sofia e Nuno, mãe e pai de Rodrigo, tentam sempre encorajar o filho a experimentar coisas novas, mas sem colocar demasiada pressão sobre este: "achamos que assim estaremos a contribuir para o aumento da confiança do nosso filho", referem os progenitores, colocando em prática as recomendações de Carl Pickhardt. Segundo este autor, as crianças devem ser estimuladas a lidar autonomamente com as suas próprias dificuldades em função da sua idade, de forma a desenvolverem competências e confiança para resolver os problemas que vão surgir, certamente, no futuro.  O que se pretende não é evitar os problemas das crianças, mas sim convidá-las, através das suas experiências reais, a resolvê-los de forma autónoma. 

É importante que tenha presente que nunca deve criticar o desempenho da criança, na medida em que isso desencorajá-la-ia a voltar a tentar - aponte-lhe sempre, em alternativa, o melhor caminho, nunca se esquecendo que os erros são oportunidades para crescer e aprender. Rodrigo tem aprendido muito! E com o tempo vai acabar por ultrapassar os recentes obstáculos erguidos pela pandemia.

 Artigo escrito e publicado pelo Sei – Centro de Desenvolvimento e Aprendizagem

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